13 de abril de 2007

PROFESSOR(A), SIM; TIO(A), NÃO?



"...A tentativa de reduzir a professora à condição de tia é uma "inocente" armadilha ideológica em que, tentando-se dar a ilusão de adocicar a vida da professora o que se tenta é amaciar a sua capacidade de luta ou entretê-la no exercício de tarefas fundamentais. Entre elas, por exemplo, a de desafiar seus alunos, desde a mais tenra e adequada idade, através de jogos, de estórias, de leituras para compreender a necessidade da coerência entre discurso e prática; um discurso sobre a defesa dos fracos, dos pobres, dos descamisados e a prática em favor dos camisados e contra os descamisados, um discurso que nega a existência das classes sociais, seus conflitos, e a prática política em favor exatamente dos poderosos.A defesa ou a pura aceitação de que é normal aprofunda a diferença que há às vezes, entre o discurso do candidato enquanto tal e seu discurso depois de eleito. Não me parece ético viver essa contradição ou defendê-la como comportamento correto. Não é com práticas assim que ajudamos a formação de uma cidadania vigilante e indispensável ao desenvolvimento da democracia.Finalmente a tese de Professora, sim; Tia, não, é que, enquanto tios e/ou tias e/ou professores, todos nós temos o direito ou o dever de lutar pelo direito de ser nós mesmos, de optar, de decidir, de desocultar verdades.Professora, porém, é professora. Tia é tia. É possível ser tia sem amar os sobrinhos, sem gostar sequer de ser tia, mas não é possível ser professora sem amar os alunos - mesmo que amar, só, não baste - e sem gostar do que se faz. É mais fácil, porém, sendo professora, dizer que não gosta de ensinar, do que sendo tia, dizer que não gosta de ser tia. Reduzir a professora a tia joga um pouco com esse temor embutido - o de tia recusar ser tia.Não é possível também ser professora sem lutar por seus direitos para que seus deveres possam ser melhor cumpridos. Mas, você que está me lendo agora, tem todo o direito de, sendo ou pretendendo ser professor(a), querer ser chamado(a) de tio(a) ou continuar a ser. Não pode, porém, é desconhecer as implicações escondidas na manha ideológica que envolve a redução da condição de professor(a) à de tio(a)..."

PAULO FREIRE

Nenhum comentário: