11 de novembro de 2006

[Fique Sabendo] Cinco países do mundo ainda usam a forca em nome da lei

Em Bagdá, no Iraque, a 5 de novembro de 2006, Saddam Hussein foi condenado à forca pelo tribunal que julgou os crimes cometidos pelo regime ditatorial que ele comandou durante 24 anos, entre 1979 e 2004. Saddam já havia declarado que preferia o pelotão de fuzilamento, para morrer como um militar.
Nações e entidades contrárias à pena de morte - como a União Européia, o Vaticano e a ONU - já se manifestaram contra a sentença e a defesa do ex-ditador pretende recorrer, de modo a alterá-la para a prisão perpétua.
A pena de morte é um tema altamente polêmico e não é este o espaço adequado para discuti-lo. Por outro lado, a forca levanta algumas questões de caráter técnico e histórico que não deixam de ser curiosas e merecem esclarecimento.
Pode-se começar pelo fim, lançando uma questão mórbida, mas essencial: você sabe como morre um enforcado? A morte por enforcamento pode ocorrer de várias maneiras. Quando se trata de uma execução judicial, o conhecimento médico-científico procura apressá-la e diminuir o sofrimento do condenado.
Fratura do enforcado
Desse modo, o tamanho da corda, a pressão do nó, o peso da vítima e o impacto que seu pescoço sofrerá no momento em que ele for executado são calculados de modo que a morte ocorra pela quebra das vértebras da coluna cervical (conhecida como "fratura do enforcado") e a secção da medula espinal, o que provoca parada respiratória.
Isso garante uma morte relativamente rápida, o que nem sempre ocorre em enforcamentos "amadores", em especial nos casos de suicídio. Por desconhecer o método correto ou usar material inadequado, o suicida pode ter uma agonia prolongada, que decorre, em geral, de asfixia ou da obstrução do fluxo sangüíneo para o cérebro.
Pode ser difícil de acreditar, mas, além do Iraque, a execução pela forca ainda é prevista no código penal de quatro países (Índia, Irã, Cingapura e Japão) e por dois Estados norte-americanos (Washington e New Hampshire). Nos Estados Unidos, porém, o último enforcamento ocorreu em 1996, no Delaware, que a partir daí substituiu a forca pela injeção letal. No Japão, atualmente, há 88 prisioneiros à espera da pena capital.
O Brasil e a pena de morte
Oficialmente, a pena de morte por enforcamento foi abolida no Brasil pelo Código Penal de 1890 e a Constituição de 1891. No entanto, a forca já não era usada por aqui desde 1855, quando ocorreu a execução de Manuel Mota Coqueiro. Como sua inocência ficou provada posteriormente, o imperador Pedro 2o houve por bem, a partir daí, comutar todas as penas de morte em prisão perpétua nas galés (embarcações movidas a remo pelos condenados).
Mas, note, está-se falando de forca e não de pena de morte. Esta permaneceu presente nas Constituições brasileiras de 1891 e 1934, embora expressamente voltada para questões militares, em tempo de guerra. Com a Constituição ditatorial do Estado Novo (1937), a pena de morte voltou a vigorar para defender a segurança do estado. Foi abolida com a Constituição de 1946 e reintroduzida por decreto da ditadura militar, em 1969, para crimes contra a Segurança Nacional.
Novamente abolida, antes do fim da ditadura, em 1978, a pena de morte foi terminantemente proibida pela Constituição ora em vigor, com exceção de crimes militares em tempos de guerra. Trata-se de uma "cláusula pétrea", isto é, que não pode ser alterada.
Suplício e morte "mais humana"
De volta aos patíbulos, não se pode deixar de lembrar que Tiradentes (Joaquim José da Silva Xavier) foi enforcado em 21 de abril de 1792, por conspirar pela Independência brasileira. O mesmo destino teria sofrido frei Caneca (Joaquim do Amor Divino Rabelo Caneca), mentor da Revolução Pernambucana (1817) e integrante da Confederação do Equador (1824). No entanto, nenhum carrasco aceitou executá-lo, sendo sua pena comutada para fuzilamento, em 13 de janeiro de 1825.
Mais uma vez deixando de lado o mérito da questão pena de morte, convém lembrar que somente a partir do fim do século 18, com o movimento iluminista, as autoridades jurídicas e políciais passaram a se preocupar em executar os condenados de maneira mais "humana".
Antes disso, como demonstrou o filósofo e historiador Michel Foucault (1926-1984), na obra "Vigiar e Punir", as mortes tinham o caráter de um espetáculo ameaçador e aterrorizante. O livro citado abre com a narrativa pormenorizada de um esquartejamento de um prisioneiro vivo, realizado em Paris em 1757. Mas não se devem esquecer as crucificações romanas, muito anteriores a Cristo, e as fogueiras nada cristãs da Santa Inquisição no século 16.
Garrote vil e guilhotinaNa Espanha franquista (1939-1975), um instrumento empregado para a pena capital era o garrote vil, uma espécie de torniquete que era colocado no pescoço do condenado, e girado até que seus ossos se partissem ou ele fosse sufocado. Os carrascos especializados no garrote vil se gabavam de poder prolongar a agonia de uma vítima em até 45 minutos.
Em prol de uma morte ligeira e indolor, o médico Joseph Ignace Guillotin (1738-1814) inventou a célebre guilhotina, mas não morreu guilhotinado, ao contrário do que muita gente pensa. A forca, empregada de modo técnico, foi considerada uma sucessora "mais humana" para a guilhotina. Posteriormente, optou-se pela cadeira elétrica e a câmara de gás.
Injeção letal
Atualmente, o método de execução considerado mais "humano" é a injeção letal, empregada em 38 Estados norte-americanos (mesmo em Washington e New Hampshire os condenados podem optar por ela). Trata-se de uma injeção intravenosa de três substâncias: o tiopentato de sódio, que é um anestésico; o brometo de pancurônio, que paralisa o diafragma e os pulmões; e o cloreto de potássio, que provoca parada cardíaca.Estatisticamente, a injeção letal é rápida, pois a morte ocorre em cerca de três minutos. Quem já experimentou qualquer sofrimento, porém, sabe como um minuto pode parecer uma eternidade. Fala-se ainda em condenados que levaram até 15 minutos para ser declarados clinicamente mortos.
Por fim, nas palavras de Shakespeare, a morte é a "terra da qual viajante nenhum jamais retornou". Desse modo, é humanamente impossível afirmar que a injeção letal é completamente indolor. Trata-se de uma suposição de quem a aplica, e não de uma constatação de quem a recebe.
Escrito por: Antonio Carlos Olivieri é escritor, jornalista e diretor da Página 3 Pedagogia & Comunicação da Folha de São Paulo - olivieri@pagina3ped.com

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